O principal objetivo do tratado é reduzir as emissões de gases do efeito estufa, de forma a que não afetem a vida no planeta e seus ecossistemas.
Bonn,
setembro de 2015 (IPS) – As negociações sobre o texto final do novo tratado
destinado a frear o aquecimento global do planeta avançam num clima entre o
nervosismo e a pressão, na cidade alemã de Bonn, embora também seja evidente a
falta de ambição que o momento requer.
O novo acordo universal
e vinculante deverá ser aprovado em dezembro, em Paris, pelos 195 países que
participarão da 21ª Conferência das Partes (COP21), a Convenção das Nações Unidas
sobre a Mudança Climática.
O principal objetivo do
tratado é reduzir as emissões de gases do efeito estufa, de forma a que não
afetem a vida no planeta e seus ecossistemas, o que se apresenta hoje como um
dos desafios mais importantes que a humanidade enfrenta atualmente.
A conferência reúne
negociadores de todos os países, que se encontram em Bonn desde o dia 31 de
agosto, e cujo encerramento aconteceu nesta sexta-feira (4/9), a menos de
noventa dias do início da COP 21 – no dia 30 de novembro.
Enquanto não se chega a
um acordo, a tensão aumenta. Nos últimos meses, muitos governos apresentaram
suas contribuições nacionais previstas e determinadas (as chamadas INDC, em sua
sigla em inglês), os documentos onde cada país explica quais são os seus
objetivos de redução de emissões de contaminantes e de adaptação aos impactos
no clima do planeta.
O conjunto desses
compromissos e objetivos deve conformar um quadro que possa evitar um aumento
na temperatura do planeta superior aos dois graus centígrados, considerado por
boa parte da comunidade científica como o limite que o planeta pode suportar –
um aumento acima desse nível colocaria em risco a preservação dos ecossistemas,
entre outros grandes impactos.
Mas as INDC, ao
parecer, ainda não são suficientes.
Segundo um estudo recente apresentado por
vários institutos internacionais, as contribuições divulgadas até agora representam
65% das emissões globais.
A análise assegura que
a ambição destas reduções não é suficiente e levariam a um nível de aquecimento
superior aos dois graus de incremento considerados seguros.
O Grupo de Governança
Para o Clima, da Universidade Politécnica da Catalunha (UPC), também realizou
em detalhe os compromissos apresentados pelos países do chamado Top-15 (os
maiores emissores): China, Estados Unidos, União Europeia, Rússia, Canadá,
Japão, Coreia e México.
Sua perspectiva de
análise é um pouco distinta, baseada nos conceitos de níveis de carbono e de
justiça climática.
Os níveis de carbono
são medidos a partir dos gases do efeito estufa, que ainda podemos emitir antes
de chegar aos dois graus, o limite seguro de aumento da temperatura. A
estimativa é de que um nível ao redor dos 1800 GT de dióxido de carbono seria
equivalente a alcançar esse limite.
A justiça climática é
um conceito que pretende integrar critérios de equidade e justiça nos acordos
climáticos. Por exemplo, levando em conta a quantidade de gases emitidos
historicamente pelos países para se formar um juízo a respeito de suas
responsabilidades – o que significa, evidentemente, exigir maior compromisso de
redução das emissões àqueles países que estão entre os maiores contaminadores
de todos os tempos, como a União Europeia e os Estados Unidos.
Combinando esses
conceitos, o grupo de investigação considerou que as contribuições apresentadas
superam amplamente o nível de carbono considerado limite pelos estudiosos do
grupo.
Segundo Olga Alcaraz,
professora da UPC, “tendo em conta os compromissos que analisamos, podemos
esperar que, lá pelo ano de 2030, o mundo já terá que enfrentar um nível de
carbono na atmosfera muitíssimo superior ao que pode suportar”.
“Os países analisados
serão responsáveis por 79% dessas emissões, perpetuando e consolidando um
modelo bastante injusto de distribuição da contaminação”, assegurou Alcaraz, em
entrevista à IPS, onde também alertou sobre os limites de temperatura recomendados
pelos cientistas.
Aplicando o conceito de
níveis de carbono sobre as propostas apresentadas pelos grandes contaminadores,
poderia se dizer que, nos próximos 15 anos, esses países superarão em 60% o
nível de carbono que poderiam gerar como máximo.
É por isso que Josep
Xercavins, também professor da UPC, destaca a importância destas negociações.
“O mais importante
agora é introduzir o conceito dos níveis de carbono e a ideia de justiça
climática nos textos que estão sendo propostos na negociação. Necessitamos um
acordo que aponte nessa direção”, afirmou o acadêmico.
A verdade é que existem
muitas formas de pressionar para que os países sejam mais ambiciosos em suas
contribuições nacionais.
A proposta mais
discutida durante as deliberações destes últimos dias em Bonn é o que se
conhece como os “ciclos de cinco anos”.
O que se busca com esse
conceito é fazer com que os países atualizem seus compromissos com relações a
suas emissões a casa cinco anos, assegurando que eles sejam cada vez mais
ambiciosos em termos de redução, e ao mesmo tempo revisar o cumprimento das
INDC anteriores.
A ideia de incrementar
continuamente a ação em favor da segurança climática poderia combater essa
falta de ambição atual, e inclusive ajudar a conseguir maior financiamento para
programas voltados a esses ciclos.
Dessa forma, os países
desenvolvidos poderiam ajudar os países em desenvolvimento a serem mais
ambiciosos, proporcionando a eles ajuda técnica e econômica.
Finalmente, os ciclos
se enquadram dentro do conceito do que se chama “objetivo a longo prazo”, que
pretende que a meta final seja a descarbonização da economia, ou seja, chegar
até a metade deste século com um nível zero de emissão de gases do efeito
estufa.
Isabel Bottoms,
investigadora da iniciativa Track 0, argumenta que “o objetivo a longo prazo é
simplesmente a visão do futuro que nós queremos”.
“Os ciclos políticos
atuais significam que as políticas domésticas são vulneráveis, já que boas
iniciativas podem ser retiradas numa mudança de governo, por exemplo,
cancelando as iniciativas de substituição de combustíveis fósseis por energias
renováveis”, afirmou a cientista.
Para ela, “um objetivo
vinculante ajuda a criar incentivos a longo prazo, que é precisamente o que as
empresas necessitam, inclusive durante as mudanças entre governos”.
Os seis dias de
negociações foram concluídos nesta sexta-feira (04/09), mas as conversas serão
retomadas em meados de outubro, tentando alcançar novamente um texto para o
acordo, que precisa ser ambicioso, bem mais que agora, e também justo, e que
estabeleça um limite efetivo para as emissões de forma a realmente preservar o
planeta de danos severos no futuro.
*Anna Pérez Català é
ambientologista e especialista em temas relacionados à mudança climática.
SITE CARTA MAIOR http://cartamaior.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário